Takes one to know one

Ela ainda estava abalada com os acontecimentos da plantação de abóboras, por um ou dois dias, sentiu calafrios, aquelas vozes no ar a atormentavam quando se encontrava no silêncio do dormitório, estava mais alerta e qualquer barulho era motivo para se colocar de prontidão. Tudo ficaria melhor se pudesse compartilhar seu pequeno tormento com alguém, mas não queria que o seu segredo se espalhasse até chegar aos ouvidos de algum professor.

Tentou fingir normalidade no passeio à cabana de Blanche com Mariana, fazendo piadinhas pelo caminho apesar da confusão que também se meteram por lá. Ela sabia muito bem esconder suas preocupações, até mesmo com aquele que era objeto do seu afeto, o lufano Luicas que desde o malfadado passeio só a tratava com indiferença e certa grosseria disfarçada.

Nem o passeio recheado a regalos promovido por Lengruber foi capaz de melhorar seu ânimo, muito menos falar mal da vida alheia quando viu de relance Àngel Del Aguirre se misturando a leva de alunos que caminhavam pelo vilarejo. Caminhava como uma sonambula, apertando uma bolsa em formato de saco que carregava para todo lado a tiracolo. Dentro dela, o misterioso ursinho de pelúcia com cara de mau que a fez tropeçar na fuga. No pé do brinquedo o nome “Tibs” que Agnes acrescentou dignidade alterando-o para “Mr Tibs” , havia algo de interessante, nele, Hunter acreditava que estivesse vivo de alguma maneira, durante a noite ela escutava o brinquedo rugir...

Estava louca? Talvez... Não seria a primeira Hunter a enlouquecer, nas paredes da sua casa existiam tantos retratos de antepassados que morreram dementes, talvez fosse algum tipo de maldição.

Melhor louca que sozinha, pensava enquanto descia em direção as masmorras, sabia que passaria bem perto da passagem que dava acesso a lufa-lufa. Poderia encontrar Luicas circulando por ali, não queria vê-lo, não mesmo, porque sabia como ele seria frio e como sairia magoada. De todas as pessoas do mundo da escola, ele era o único que conseguia magoá-la de verdade por inúmeros motivos e naqueles dias, estava se empenhando e muito para deixá-la mal, apertou o passo de cabeça baixa, mas não conseguiu escapar do azar, como uma alucinação fora de hora, viu a imagem de Pendragon se materializando no corredor, não poderia desviar ou simplesmente ignorar, parou tentando não encará-lo.
- Ah, você. – Disse baixinho. – Eu estava indo para a sonserina. – Apontou o corredor no sentido oposto com a mão direita, enquanto a esquerda puxava com força desnecessária a bolsa onde estava o estranho objeto.

Vivia cantarolando a canção pelos cantos. Gastava tinta e pergaminho para fazer desenhos de pássaros negros, só para depois riscá-los como se quisesse apagá-los do papel e da sua mente. Porém, em seus momentos de devaneio, mais corvos vinham rolando pelas folhas, enfeitando suas tarefas, anotações e inscrições para Universidades. Considerava tudo arruinado, jogava em cima de sua cama no dormitório e saia do castelo para o Círculo de Pedra, onde ficava sentado por horas apenas encarando a horta lá embaixo e assobiando a melodia, como se esperasse que um dia o espantalho o acompanhasse.

A frequência disso diminuía, cada vez mais recuperava sua sanidade. Mas tinha uma coisa que a fazia voltar com força total: apenas um simples olhar para Agnes e o ursinho que ela agora levava para cima e para baixo. Era a causadora de suas dores fazendo amizade com o inimigo. Sim, inimigo, porque aquele tal de Mr. Tibs não podia ser coisa boa. Ninguém abandonava um ursinho no meio de Hogwarts e, se por acaso ele estivesse perdido, do jeito que Agnes carrega o brinquedo, sua dona já teria o procurado. Era tudo muito suspeito. Podia ver o olhar aterrorizante do bichinho, como se ele lhe seguisse com os olhos.

Portanto, para evitar a lembrança das dores e do medo, fugia o máximo de Agnes e quando a encontrava era apenas para trocarem palavras que a machucavam.

Em um desses dias, quase recuperado totalmente, deu com Agnes no corredor que levava à Lufa-Lufa. Ela queria ir para a Sonserina, estava longe de seu ninho e aquilo despertou fúria em Luicas, ainda mais quando ele percebeu que a alemã apertava a bolsa de seu encontro. Apesar de sua pouca inteligência, não precisou de muito para adivinhar que o ursinho de pelúcia estava dentro da bolsa.

- O caminho para a Sonserina é longe daqui. Você insiste em me ver. – passos para perto da garota. Ele era muito grande para ela, podia quebrá-la se quisesse. Sabia que podia, mas não queria. Agarrou a bolsa que Agnes levava, tentando puxá-la para si. – Ainda mais com esse urso aí. – empurrava a namorada com a outra mão, tentando rasgar a bolsa. – Não vê que é uma peça daquele espantalho filho da p#t@? Ela quer te enfeitiçar! Já enfeitiçou! Você não larga essa merda nem para ir para a aula. Me dá ele...

Por mais que não percebesse suas intenções, estava disposto a machucar Agnes para destruir aquele urso de pelúcia.

Resumo escreveu: Luicas continua cabisbaixo pelo acontecido com o espantalho. Acaba encontrando Agnes e tenta fazê-la entregar o urso de pelúcia que achou naquele dia para ele.

Estava confusa, nunca imaginou que as coisas com Luicas tivessem chegado aquele ponto, se ele queria algo era só pedir. Nunca negou nada ao lufano, mas ultimamente ele estava violento, estúpido, talvez esse lado negro estivesse apenas adormecido e agora andava desperto a pressionando e puxando com força sua bolsa a ponto de machucar o ponto em cima do ombro onde a alça era friccionada.

Um abuso, uma violência, não imaginava que seu doce namorado poderia se transformar naquele monstro e não, não era sua culpa. Por todo aquele tempo, ela nunca o obrigou a fazer nada, tudo o que Pendragon fez foi por escolha dele e só dele, por isso aquelas acusações veladas dos dias anteriores não passavam de ofensas. Não, a sonserina nem de longe estava enfeitiçada, ela só queria saber, sua sede por conhecimento e ambição características tão comuns aos herdeiros de Salazar foram aguçadas com aquele objeto, porque era tão difícil compreender?

Agora ali, os dois praticamente lutando, sabia que era pequena, mas possuía outra armas porque sabia que assim que Luicas colocasse a mão no urso ele acabaria todas as suas chances de desvendar o mistério da plantação de abóboras porque se aquele espantalho sem graça achava que Hunter deixaria o susto no passado, estava enganado. Ela acabaria com ele e sabia que o brinquedo era a chave. –Quem você pensa que é para fazer isso comigo? Tire as mãos de mim e das minhas coisas Luicas ou eu vou gritar tão alto que antes que você consiga murmurar uma desculpa este corredor vai estar cheio de gente para ver o ex-monitor batendo em uma garota por causa de um ursinho de pelúcia.

O garoto puxava a bolsa cada vez mais forte, buscando ceder a alça que a prendia ao corpo esguio da namorada. Podia ver que aquilo a machucava, mas ao conseguir ver que o conteúdo da bolsa era realmente o ursinho, ficou ainda mais possesso e com vontade de consegui-lo.

Nem as palavras com tom de ameaça fizeram o garoto recuar. Ficou um pouco amedrontado em saber que a qualquer hora alguém podia chegar e ver os dois assim. Não havia pensado nisso, embora brigas de casais sempre acontecesse em todas as partes do castelo, inclusive as deles. Pensou, porém, que quanto mais rápido conseguisse a bolsa, mais rápido sairia dali sem que ninguém testemunhasse o caso dos dois.

- Um ursinho de pelúcia que trará nada boas consequências no futuro. Serei um herói para todos no castelo quando queimá-lo na lareira!

Talvez pudesse puxar a varinha e acabar com isso de uma vez, deixando a namorada petrificada no meio do corredor. Mas só o que queria era o urso. Não tinha como finalidade machucar Agnes, embora estivesse o fazendo sem pensar direito.

- Espere e verá.

Resumo escreveu:A briga entre Luicas e Agnes continua.

Rolando um dado:
1 – Resistir à intimidação.

A garota alemã possuía uma língua afiada, sabia que não poderia competir em força física, mas por sorte, outros atributos nem tão visíveis também eram úteis. Seu ombro ainda estava quente, mas sabia que sua artimanha havia funcionado.

-Pode ficar com esta m#$%@! – Ele finalmente soltou a sua bolsa e recuou um pouco, apesar do lufano não querer transparecer, a sonserina sentia que ele havia acatado sua ameaça e sua aparente desistência era permeada com um pouco de medo, Luicas sabia que Hunter não fazia ameaças em vão.

Agnes puxou a bolsa para o outro lado e passou as mãos pelos cabelos ainda encarado Pendragon e indignada com a atitude do rapaz, mas ela era orgulhosa e por mais que gostasse dele e sentisse a falta do “outro” Luicas, jamais aceitaria aquele tipo de afronta porque apesar da sua juventude, sabia que se deixasse acontecer uma vez, aconteceria outra, mais outra e mais outra até não haver mais respeito e Hunter jamais suportaria se degradar desta maneira.

-Acabou Luicas. – Não havia violência em sua voz, muito menos alterações que poderiam demonstrar histeria, parecia se despedir de um amigo de longa data. Uma frase curta, composta de duas palavrinhas ingratas que machucaram sua garganta. Não haveria mais casal de propaganda de revista, muito menos surpresas na curva do corredor, talvez restasse alguma lembrança boa, mas a jovem era orgulhosa demais para não remoer as coisas ruins.

Virou de costas, caminhando na direção do início da conversa se contendo para não voltar atrás e retirar tudo o que disse, dizer que tudo bem, que poderiam fazer o que Pendragon quisesse, que aquela era só uma fase ruim, mas foi firme na sua decisão. Saiu apressada na direção indicada no início da conversa, mas não foi para a Sonserina. Entrou em um corredor estreito e sem saída, iluminado apenas por um archote.

Queria pensar um pouco, não ouvir as conversas do dormitório, não queria sentir inveja das meninas que conversavam alto sobre os acontecimentos alegres do passeio.